sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Amargar (pt.2)

Leia a parte 1


          Queria voltar atrás, mudar os erros do passado. Só nos damos conta das dores que causamos, quando não podemos mais remediar, quando já é tarde demais para enxugar as lágrimas, quando a diferença entre o fazer e o feito é uma tênue linha que liga e cela o destino de cada um de nós.

          Continuo a olhar sempre em frente, não ouso mais olhar acima dos meus pés, não quero encarar as pessoas, elas não tem culpa pelo que eu fiz, elas não merecem estar ali, mesmo que sem saber, andando lado á lado com um monstro, é exatamente isso me tornei, um monstro, o mesmo que eu afugentava da mente dos meus pequenos nas noites frias, os mesmos que eu tinha que lidar todos dias.


          Essas memórias me trazem mais dor, mais lembranças, mais angustias, mais sofrimento. Minhas pernas não mais me respondem, minhas mãos suam, meu coração palpita, sinto-me ofegante, cansado, extenuado, não há mais forças para continuar, só desejaria agora, como um último pedido de uma alma moribunda, que meu sofrimento acabasse, que meu fim fosse rápido e indolor, sei que não mereço toda essa misericórdia, mas em meio a minha monstruosidade, ainda tenho uma centelha humana.

          Continuo a caminhar e mal posso acreditar onde meus passos me trouxeram, meus olhos marejados só conseguem identificar as formas e as poucas cores, porque a imagem já me é familiar, um desespero suplanta minha alma, uma força incontrolável que me faz querer gritar, mas não consigo, só tenho forças para gemer, gemer de dor e de sofrimento.

          Agora de joelhos só penso em minha família, nos dias bons, no amor e no carinho. De joelhos diante de uma igreja, um clichê que o destino nos impõem, talvez minha alma querendo perdão, talvez meu corpo suplicando por descanso, não me sinto digno do chão no qual eu rastejo, não me sinto no direito de rogar a um Deus que não sei se existe, um Deus que me impôs a maior das provações, e pela qual eu certamente falhei.

          Com dificuldade me levanto, ainda meio desnorteado pelo devaneio, uma suplica inconsciente e descrente de salvação. Minhas mãos estão encharcadas, minha fronte gotejando entre lágrimas e um suor frio, a brisa gélida da noite corre tornando ainda mais difícil manter o corpo rijo sobre as pernas que já não suportam mais o peso do próprio corpo, a dor agora se mistura com mal estar, a fome, a angustia incessante.

          Cambaleante me encaminho a praça em frente a igreja, recosto-me a relva sob uma árvore, ali descanso o corpo, a mente foge-me longe, os pensamentos escorrem, a dor se acalenta em meu âmago, e só.


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